Em longo artigo publicado no Washington Post, o analista Fareed Zakaria fez uma excelente avaliação das forças geopolíticas que conspiram hoje contra a atual ordem mundial, contra a hegemonia dos Estados Unidos e contra os princípios da revolução liberal.
Mas Zakaria se ateve puramente à dinâmica geopolítica que conduz as ações dos grandes adversários dos Estados Unidos: a China de Xi, a Rússia de Putin, o Irã de Khamenei e de outras peças de menor calibre.
O que se pode observar à análise de Zakaria é que, por baixo ou concomitantemente a esse megajogo de poder global, há enormes transformações em curso que podem mudar tudo, embora não se saiba ainda com que resultado. Esta coluna se propõe a apontar algumas dessas transformações, todas elas já de conhecimento geral.
Uma delas é de cunho demográfico. A população mundial está envelhecendo a um ritmo veloz. É fator que já está pesando sobre as políticas públicas de saúde e de previdência e vai pesar ainda mais. Os governos terão de adaptar as cidades às novas condições de mobilidade, ampliar a rede de apoio aos idosos, o que deverá ser fator tão importante quanto são hoje creches e escolas de primeiro grau.
O fator político mais relevante é o de que uma comunidade predominantemente de coroas tenderá a votar de maneira mais conservadora e isso pode mudar muita coisa na vida política.
Outra transformação alcança hoje as relações de trabalho. O grande fornecedor de postos de trabalho já não é mais a indústria, mas o setor de serviços. A enorme profusão de aplicativos e a Inteligência Artificial (IA) não apenas estão fechando postos de trabalho, mas, também, possibilitam grande proliferação do trabalho autônomo e novos regimes de ocupação, como o teletrabalho e o home office. O profissional está se libertando do cartão de ponto, da jornada rígida de trabalho e de outros vínculos trabalhistas.
Os sindicatos, por exemplo, estão se enfraquecendo, a legislação trabalhista vai ficando desatualizada e as instituições de proteção aos direitos do trabalhador já não ajudam como antes. O impacto político dessa revolução é um grande ponto de interrogação.
O aquecimento global e a inevitável transição energética também começam a mudar muita coisa na geopolítica. Os senhores da Opep tendem a perder protagonismo e isso já pode mudar as relações de poder no Oriente Médio. Países em condições de desenvolver novas fontes de energia e tecnologias a ela ligadas saltarão à frente. No mundo todo, a indústria de transformação não será mais a mesma.
A tecnologia de informação (computadores, chips, aplicativos, robotização, etc.) e a já mencionada Inteligência Artificial são fatores de transformação cujo impacto mal começa a ser vislumbrado. É preciso acompanhar até onde irá a grande expansão do mercado financeiro, que há alguns anos era apenas uma fração do PIB global, e hoje se mede em mais de 20 PIBs com impacto que já começa a ser sentido no comércio e na circulação de riquezas.
Enfim, este é o limiar de outro Admirável Mundo Novo, onde muita coisa acabará por mudar, especialmente as relações geopolíticas.