Numa eleição, cada voto conta, é claro. Mas, de fato, quantos votos decidirão a eleição presidencial deste ano nos EUA? Provavelmente algumas poucas centenas de milhares. Mas pode ser até menos. Nesta reta final de campanha eleitoral, a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump estão desesperadamente atrás desse punhado de eleitores indecisos.
Numa disputa eleitoral normal nos EUA, os eleitores indecisos costumam não ter impacto relevante no resultado final. Mas, quando a diferença entre os candidatos nos Estados decisivos cai para abaixo de um ponto percentual, o voto dos indecisos pode definir o vencedor. É o que parece que vai acontecer nas eleições deste ano, já que as pesquisas indicam empate técnico entre Kamala e Trump nos sete Estados decisivos.
Os EUA têm hoje cerca de 346 milhões de habitantes. Desses, 244 milhões têm direito a voto, segundo estimativa do Bipartisan Policy Center. Mas nem todos vão votar. Nas eleições de 2022, 66,6% dos americanos com direito a voto de fato votaram. Foi o maior percentual desde 1968. Se esse percentual se repetir, cerca de 161 milhões de americanos votarão neste ano.
Mas as eleições presidenciais nos EUA não são definidas no voto popular, e sim por um Colégio Eleitoral. Esse Colégio tem hoje 538 eleitores. Para ganhar uma eleição, é preciso somar 270. Cada Estado tem um número de delegados eleitores nesse Colégio, mais ou menos de acordo com sua população. A Califórnia é o maior, com 54, seguida por Texas (40) e Flórida (30). Os Estados menos populosos têm 3 delegados: Wyoming, Vermont, Dakota do Sul, Dakota do Norte, Delaware e Alasca.
O candidato que vence no voto popular num Estado fica com todos os delegados eleitores daquele Estado no Colégio Eleitoral, não importando a diferença de votos para o segundo colocado. Nesse sistema único dos EUA, um candidato pode perder no voto popular (ganhando de pouco nos seus Estados e perdendo de muito nos demais) e ainda assim vencer a eleição presidencial. Isso já aconteceu cinco vezes, sendo duas na história recente: em 2000, com a vitória do republicano George W. Bush, e em 2016, com a vitória do também republicano Donald Trump. Ou seja, aparentemente esse sistema favorece os republicanos.
Como o voto é muito estável nos EUA, na maioria dos Estados já se sabe de antemão quem vai ganhar. Em Nova York, Oregon e na Califórnia, Harris ganhará, segundo as pesquisas. No Texas, em Montana e na Flórida, Trump vencerá. Das 51 unidades da federação nos EUA (50 Estados e o Distrito de Colúmbia), só em 7 há uma disputa de fato entre os dois candidatos. São os chamados “swing states”, os Estados que oscilam entre democratas e republicanos.
Esses sete Estados são: Pensilvânia, Wisconsin, Carolina do Norte, Geórgia, Michigan, Arizona e Nevada. Neles, as pesquisas indicam Kamala e Trump empatados tecnicamente. São eles que decidirão a eleição presidencial. Juntos, somam pouco mais de 60 milhões habitantes e cerca de 41 milhões de eleitores aptos a votar. Em 2020, 31 milhões de fato votaram.
A imensa maioria dos eleitores desses Estado, no entanto, já definiu o seu voto. Segundo as pesquisas, apenas de 2% a 4% dos eleitores ainda estão indecisos. Ou seja, Kamala e Trump estão pescando votos decisivos num universo que provavelmente vai de 600 mil a 1,25 milhão de pessoas.
Mas o número de votos decisivos deverá ser ainda menor. Isso porque nem Kamala nem Trump precisam ganhar em todos os sete Estados. Dependendo do tamanho do Estado, três ou quatro podem bastar.
Na eleição de 2020, o presidente Joe Biden ganhou em 6 desses 7 Estados. Trump venceu apenas na Carolina do Norte. No Arizona, na Geórgia e em Wisconsin a diferença entre eles ficou abaixo de 1% dos votos válidos. Uma mudança de somente uns 21 mil votos teria dado a vitória a Trump nesses três Estados, e ele estaria hoje na Casa Branca.
Esse cenário de alguns milhares de votos decidindo Estados-chave pode se repetir, e até se ampliar, na eleição deste ano. Por isso esses Estados são tão importantes na disputa e devem concentrar a maior parte do tempo e da verba de propaganda dos dois candidatos.
Mas quem são esses eleitores que ainda estão indecisos às vésperas da votação?
Segundo o estudo do Cooperative Election Studies (CES), realizado por um grupo de universidades americanas para entender melhor o eleitorado, a maioria dos indecisos na reta final são eleitores que não se interessam por política. Só 29% deles, por exemplo, sabiam dizer que partido controla o Senado. Dois terços não se identificam com nenhum dos dois grandes partidos americanos, mas também não se definem como independentes.
O maior desafio para os candidatos é fazer esse eleitor votar. Nas últimas duas eleições, Trump capturou a maioria (cerca de 60%) dos votos dos indecisos que foram às urnas, numa sinal de que entre ele havia um parcela importante de eleitores republicanos que estavam relutantes em votar num candidato tão polêmico. Será que Trump conseguirá captar esses votos novamente. Segundo pesquisa “NYT”/Siena, 9% do eleitorado republicano tradicional diz que neste ano votará na democrata Kamala, numa indicação de que a rejeição ao ex-presidente pode ter crescido.
Kamala buscou falar a uma parte desse eleitorado ao dar, na semana passada, uma rara entrevista à Fox News, canal de notícias conservador que apoia abertamente Trump. Apesar de ser vice-presidente, ela também é bem menos conhecida do eleitorado do que Trump e entrou tarde na disputa. Muitos desses indecisos ainda podem estar avaliando a candidata democrata.
Mas Kamala tem também seus problemas. Ela vem perdendo apoio entre latinos e negros, e muitos jovens estão insatisfeitos com o apoio do governo democrata de Biden a Israel na guerra em Gaza.