Citado no processo do TSJ (Tribunal Supremo de Justiça) da Venezuela que busca estabelecer a legitimidade da vitória de Nicolás Maduro nas eleições presidenciais do país, o candidato da oposição, Edmundo González, afirmou nesta quarta-feira (7) que não comparecerá à audiência convocada pelo órgão.
Em carta publicada em suas redes sociais, o candidato opositor questionou então a legalidade do processo, que além disso foi aberto pelo próprio Maduro.
“Este é um procedimento imparcial que respeita o devido processo? Estou sendo condenado antecipadamente?”, questiona González em comunicado reproduzido no X.
“Se eu for à Câmara Eleitoral nestas condições, estarei absolutamente vulnerável uma vez que não terei direito à defesa e ao devido processo e colocarei em risco não só a minha liberdade, mas, mais importante, a vontade do povo venezuelano expressa em 28 de julho”, completou, referindo-se à data do pleito presidencial.
Chama a atenção na carta o fato de González não assiná-la como “presidente eleito”, tal como fizera em missiva pública anterior. O último parágrafo do texto divulgado na segunda-feira (5) dizia: “Nós ganhamos esta eleição sem discussão alguma. […] Agora cabe a todos nós fazer respeitar a voz do povo. Procede, imediatamente, a proclamação de Edmundo González Urrutía como presidente eleito da República.”
Principal cabo eleitoral de González e antichavista mais popular do país, María Corina Machado também firmou a carta do dia 5, assinando como “líder das forças democráticas na Venezuela”. A dupla pediu às Forças Armadas do país que não sejam cúmplices do chavismo e reconheçam que Maduro foi derrotado nas urnas, ao contrário do que anunciou, sem apresentar nenhuma ata eleitoral publicamente, o CNE (Conselho Nacional Eleitoral).
González e María Corina afirmavam ainda que, “como governo eleito”, seriam oferecidas garantias aos militares que “cumprirem seu dever constitucional”, com a ressalva de que “não haverá impunidade”.
O tom da carta desta quarta é bem mais comedido. Agora sem a assinatura de María Corina, González insta as autoridades a “recuperar a sensatez e buscar em diálogo franco vias que canalizem os argumentos de cada parte, na instância competente constitucionalmente e em um marco aceitável para todos, no qual os direitos humanos fiquem a salvo e o respeito à vontade do povo seja a máxima irrevogável”. Maduro é citado como “cidadão”, não como presidente, e não há nenhuma menção aos militares desta vez.
À “Folha de S.Paulo”, interlocutores próximos aos líderes opositores afirmaram que a carta de segunda-feira não tinha a intenção de sinalizar um governo paralelo ao regime de Caracas, mas, sim, de confirmar o que as atas eleitorais que possuem em mãos dizem – que González venceu o pleito, tendo obtido cerca de 67% dos votos, contra 30% de Maduro.
A oposição diz possuir pouco mais de 80% das atas do processo, que tornou acessíveis ao público, ao contrário do regime. Tanto a contagem de votos feita pela coalizão opositora quanto a veracidade das atas divulgadas foram confirmadas por organizações independentes.
Pouco após a divulgação da missiva, o Ministério Público venezuelano anunciou a abertura de uma investigação contra os dois.
Países reconhecem González como presidente eleito
Diversos países já reconheceram González, que é ex-diplomata, como o vencedor, entre eles os Estados Unidos – nesta quarta, a Argentina, que tinha reconhecido o opositor como presidente eleito e depois voltado atrás, oficializou seu apoio a ele. O presidente do Chile, Gabriel Boric, também disse não reconhecer a vitória de Maduro.
Já o trio Brasil, Colômbia e México, negociadores de alta importância neste cenário, pede que o regime publique os dados desagregados e, mais, as atas eleitorais, para que uma checagem independente seja possível.
Em 2 de agosto, o CNE – acusado de seguir uma linha governista – ratificou a vitória de Maduro com 52% dos votos válidos, sem tornar públicas as atas eleitorais, alegando ter sido vítima de hakeamento cibernético. O presidente do conselho, Elvis Amoroso, afirmou na segunda-feira que havia entregue as atas ao TSJ venezuelano.
A proclamação de Maduro gerou protestos em todo o país que deixaram pelo menos 11 mortos. Maduro disse que há mais de 2.200 detidos, que serão transferidos para duas prisões de segurança máxima.